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Uma bela história musical que era para ter sido contada no Cinema Mundial, acabou por ser mudada para o espaço Carpe Diem Arte e Pesquisa e ficámos muito felizes com esta mudança.
Tudo começou numa quente noite de fim de Maio, num palácio escondido no meio do Bairro Alto, que em tempos foi a residência da família de Marquês de Pombal. O local perfeito para um conto que teve tudo para correr bem. A entrada não denuncia o que espera a quem nunca lá entrou. Depois de se entrar, atravessam-se dois corredores que vão dar a um jardim inacreditavelmente grande, quase como se fosse a passagem para um universo paralelo através da porta de um roupeiro.
Depois de nos instalarmos convenientemente nas mesas deste jardim intemporal, cigarro após cigarro, o público começou a chegar e a apropriar-se das mesas e do chão. Os músicos tratavam dos preparativos até chegar a vez de Surma tocar. Já a tínhamos visto no Sofar Sounds e sabíamos que não iria decepcionar. Com o palco montado, aparelhos e instrumentos no sítio, Débora Umbelino, escreveu e contou o primeiro capítulo deste belo conto. Com um pano enrolado à volta do microfone, a sua voz pintava-se através de um eco alusivo ao canto das sereias, provocando o mesmo efeito de atracção. A mística de uma artista que vence e convence a cada concerto com que nos presenteia é, cada vez mais, uma das maiores potências da música electrónica em Portugal.
Na expectativa do segundo capítulo começar, Gil Dionísio deixou Bad Bad Not Good em repeat, enquanto esvaziavam o palco. As luzes passaram a focar-se somente no trono de Ricardo Martins. A verdade é que este criativo só precisa de uma bateria e de uma loop Station para cravar nos nossos ouvidos som para além do ritmo. A expectativa passava precisamente por ser um concerto a solo de um baterista. Da expectativa à realidade nasceu a (Re)criação de Ricardo Martins, jovem de poucas palavras, que se limitou a sentar, engasgar as baquetas e explodir com a bateria. Camada após camada, o ritmo crescia em sentidos impensáveis, provocando tumultos musculares a quem se deixava estremecer pela vibração das colunas. Poucos são os artistas que conseguem dar um concerto com um instrumento, duas ou três palavras e criar uma dinâmica incansável.
Agora sim, o terceiro e último capítulo, contado pelos protagonistas da noite, Los Negros. Este capítulo começa com uma particularidade, baldes de água espalhados pelo recinto onde habitava o público. Gerou-se a dúvida e os sussurros que especulavam sobre o que ali se passava. Dúvidas que só foram tiradas quando Los Negros se aproximaram dos baldes e durante 5 minutos colocavam a cabeça nos alguidares a ver quem aguentava mais tempo debaixo de água. Após esta bizarra performance, começaram a caminhar para o palco, pelo meio do público e já dentro da personagem, Sara Ribeiro beijou umas quantas pessoas até chegar ao microfone. O que aconteceu a seguir foi uma tormenta de emoções, algo indescritível e difícil de processar. Foi o que poderíamos definir como “Amor nos Cornos”, que para além de ser o nome do EP da banda, é a definição perfeita para a performance apresentada. A componente teatral envolve-se com a música, deixando o espectador por vezes a pensar se foi ver o lançamento de um álbum ou uma experiência transcendental, tendo direito a momentos cómicos, mas também a momentos de pura atracção pelos músicos/actores.
A noite foi fechada por The Incredible Padrada Boyzgang Soundsystem, um DJ Set que abraçou alguns hits do início do século, passando também por música ligeira, deixando toda a gente na pequena sala ao rubro.
Só mesmo vendo estes bichos de palco é que é possível sentir o que nós sentimos, quando marcámos presença neste evento. Felizmente, vais poder vê-los a actuar no dia 11 de Junho do Teatro Ibérico, que contará também com as actuações de Filho da Mãe e de Jibóia.