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Um tribunal espanhol condenou na passada quinta-feira a nove anos de prisão e cinco de liberdade vigiada por abuso sexual, e não por violação, cinco homens que agrediram sexualmente em grupo uma jovem de 18 anos durante as festas de San Fermín, uma das mais famosas festas populares espanholas, em Pamplona.
O caso remonta a 2016 e os cinco homens — José Ángel Prenda, Alfonso Cabezuelo, Antonio Manuel Guerrero, Jesús Escudero e Ángel Boza — encontravam-se em prisão preventiva desde a sua detenção, a 9 de Julho do mesmo ano. Os dois primeiros são militares, o terceiro é agente da Guardia Civil.
O caso ficou conhecido por “La Manada”, o nome do grupo de conversação na rede social WhatsApp por onde os cinco amigos de Sevilha comunicavam.
A acusação interposta pelo Município de Pamplona e pelo Governo de Navarra pedia 22 anos de prisão, mas depois de cinco meses de deliberação a decisão foi diferente. Um dos magistrados, o juiz Ricardo González, chegou mesmo a votar pela absolvição dos arguidos, que tinham entre 27 e 29 anos à data.
Com esta condenação, a sala da Audiência de Navarra, em Pamplona, entende que os abusos se realizaram sem consentimento da mulher, mas justifica a decisão dizendo que não foi usada violência nem intimidação, condições para que a agressão fosse considerada violação segundo o Código Penal espanhol.
A indignação generalizada com a sentença tem levado a uma série de protestos por toda a Espanha, que levaram inclusivamente o Governo de Mariano Rajoy a admitir rever a legislação sobre casos de violação. Na sexta-feira (dia 27), o Ministro espanhol da Justiça, Rafael Catalá, pediu a revisão do enquadramento legal dos crimes sexuais. O anúncio foi feito pelo porta-voz do Governo Íñigo Méndez de Vigo, em conferência de imprensa: “O Governo sempre esteve e estará com as vítimas (…) e vai continuar a lutar contra o flagelo da violência contra as mulheres”.
Todos os arguidos receberam uma ordem de restrição e de comunicação com a vítima durante os cinco anos de liberdade vigiada e cada um terá de pagar 10 mil euros de indemnização à jovem (50 mil euros no total). Apenas um dos arguidos, Antonio Manuel Guerrero, terá ainda uma pena adicional de dois meses por também lhe ter roubado o telemóvel.
Na sexta-feira, o Ministério Público de Navarra indicou que apresentará, nos próximos dias, um recurso à sentença aplicada ao caso La Manada, uma vez que os factos “são constitutivos de um crime de agressão sexual — violação — e não apenas de abuso sexual”. A equipa de defesa da vítima confirmou também que vai recorrer da decisão.
O debate sobre o consentimento do ato esteve, como sempre, no centro da discussão. Segundo um relatório da polícia, nos vídeos que foram analisados pelo tribunal, filmados pelos arguidos e partilhados entre o grupo, a rapariga mantém uma atitude “passiva ou neutra”, com os olhos sempre fechados. Em tribunal, a jovem declarou que não opôs resistência dada a superioridade numérica e física dos abusadores, o que a fez entrar em choque — “só queria que tudo acabasse depressa e então fechei os olhos para não ter de ver nada”, declarou em depoimento.
A sentença foi contestada por dezenas de pessoas que se encontravam à porta do tribunal de Pamplona e levou, desde esta quinta-feira, milhares de espanhóis às ruas em protesto.
Através das hashtags #NoEsNo, #YoSiTeCreo#NoEsAbusoEsViolacion ou #LaManadaSomosNosotras, os espanhóis foram convocados nas redes sociais para protestos em vários pontos do país.
“Consentir não é desejar violência”, “Não é agressão, é violação”, “É violação, não é abuso” ou “Eu acredito em ti”, em referência à vítima, foram algumas das mensagens que se leram e ouviram em cidades como Madrid, Barcelona, Valência, Saragoça, Granada, Vigo ou Bilbau. As manifestações espalharam-se pelo mundo com presença em cidades como Londres, Paris, Berlim ou Lisboa, onde dezenas de mulheres se reuniram na Praça Luís de Camões.
À Paris aussi, des féministes manifestent contre le verdict de la justice espagnole à l’encontre de #LaManada. #YoTeCreo ♀ pic.twitter.com/UNcy9Pm9l4
— Léa Marie (@lea_mbls) April 29, 2018
Manifestación frente a la embajada española de Londres en contra de la sentencia contra la manada. #NoEsNo #Justicia #violacion #manada pic.twitter.com/5khN0Lm9gj
— Iñaki Gómez (@gomezinaki) April 26, 2018
Hermana, tu manada también está en Berlín #YoSiTeCreo #LaManada #JusticiaPatriarcal pic.twitter.com/SprdyoWYSD
— Sagrario Monedero (@SagraMonedero) April 26, 2018
1 – Mais algumas fotografias de ontem em #Lisboa. #NoEstasSola irmã. #LaManadaSomosNosotras#YoSíTeCreo#Cuéntalo #Portugal #MexeuComUmaMexeuComTodas #FilhasDaLuta pic.twitter.com/4YqErkdVox
— Re-sus (@ResusLis) April 29, 2018
O apoio à vítima e a casos como este tem chegado de todo o lado. Esta semana, 16 freiras Carmelitas de um convento em Hondarribia, no País Basco, publicaram no Facebook uma mensagem de apoio no mínimo sui generis: “Vivemos em reclusão, vestindo um hábito que nos tapa até aos tornozelos. Não saímos à noite, não vamos a festas, não bebemos álcool e fizemos um voto de castidade. E porque esta foi uma escolha nossa livre, defendemos o direito a todas as mulheres poderem fazer o contrário de FORMA LIVRE, sem serem julgadas, violadas, ameaçadas, mortas ou humilhadas.”
Além de várias personalidades espanholas e internacionais também se terem manifestado publicamente contra a decisão, depois de conhecida a sentença, a própria polícia espanhola publicou um tweet onde repetia várias vezes a frase: “Não é não”.
#NoesNo#NoesNo #NoesNo#NoesNo#NoesNo#NoesNo#NoesNo#NoesNo#NoesNo#NoesNo#NoesNo#NoesNo
ESTAMOS CONTIGO
📞091— Policía Nacional (@policia) April 26, 2018
5 strangers told an intoxicated teenager that they would walk her to her car. Instead they took her to another location where they filmed gang raping her. Being motionless with her eyes closed doesn't equate consent. That isn't sexual abuse. It's rape. https://t.co/rHmcsZHSH3
— Jessica Chastain (@jes_chastain) April 26, 2018
Bravo, @kapdigital 👏🏼 #NoesNo #YoSiTeCreo pic.twitter.com/7zUGXzPGJu
— Toni Aira🎗 (@toniaira) April 29, 2018
Se eles son manada nós somos multitude. Non é abuso, é unha violación. Noxo de sentencia. #NoEsNo #LaManada #JusticiaPatriarcal #LaManadaSomosNosotras #NoEsAbusoEsViolación #HermanaYoTeCreo #YoSiTeCreo pic.twitter.com/hWyl0L4Qcm
— Lucía Silva (@lusilca81) April 26, 2018