Mapplethorpe: o perfil do artista que fez abanar Serralves e a cultura nacional

Procurar
Close this search box.
Robert Mapplethorpe
Robert Mapplethorpe e Patti Smith, Brooklyn, 1968

Mapplethorpe: o perfil do artista que fez abanar Serralves e a cultura nacional

A democracia precisa de quem pare para pensar.

Num ambiente mediático demasiado rápido e confuso, onde a reação imediata marca a ordem dos dias, o Shifter é uma publicação diferente. Se gostas do que fazemos subscreve a partir de 2€ e contribui para que tanto tu como quem não pode fazê-lo tenha acesso a conteúdo de qualidade e profundidade.

O teu contributo faz toda a diferença. Sabe mais aqui.

Foi na altura dos anos 1970 que Mapplethorpe começou a produzir trabalho mais polémico, interessando-se em Nova Iorque pela cultura oculta de S&M, abreviatura de "sadomasoquismo".

Se estás a par da situação de Serralves, o nome Robert Mapplethorpe já não te é estranho. E para aqueles que têm estado alheados da situação, no Shifter tentámos por-vos a par de toda a situação. Neste artigo, e para complementar o caso, desvendamos um pouco da vida e carreira do fotógrafo norte-americano.

Robert Mapplethorpe nasceu em Floral Park, um bairro de Queens em Nova Iorque, no dia 4 de Novembro de 1946. Em 1963, ingressou no Pratt Institute para estudar Artes Gráficas, tendo aprendido também desenho, pintura e escultura. Mas em 1969 desistiu, tornando-se um “college dropout” para ir viver com a cantora e poetisa Patti Smith, amiga que sempre apoiou a sua aptidão artística. Para além desta aparecer em várias suas fotografias, é também mencionada nos seus livros. A sua amizade era intensa e os dois acabaram por terem uma relação amorosa. Mapplethorpe ganhou particular interesse pela fotografia em 1970, ao ter-lhe sido oferecida uma máquina Polaroid.

O nascimento do fotógrafo

No início, Mapplethorpe tirava fotografias com o intuito de as incorporar nas suas colagens, mas mais tarde percebeu que estas tinham um poder e sentido próprio. Em 1973, foi inaugurada a sua primeira exposição, denominada precisamente de “Polaroids”. Mais tarde, comprou uma câmara de médio formato da conceituada marca Hasselblad e com esta começou a fotografar o seu círculo de amigos e os momentos passados no Chelsea Hotel, enquanto fazia também alguns trabalhos comerciais, como capas de álbuns e retratos para algumas revistas.

Foi na altura dos anos 1970 que Mapplethorpe começou a produzir trabalho mais polémico, interessando-se em Nova Iorque pela cultura oculta de S&M, abreviatura de “sadomasoquismo” – que, resumidamente, consiste na ligação entre sadismo (acto de obter prazer na provocação de dor e sofrimento) e masoquismo (acto de obter prazer na vivência da dor e sofrimento).

Mapplethorpe defendia o seu trabalho, afirmando que não o fazia com o intuito de chocar, de causar indignação, mas sim de trazer à vista uma comunidade, de os representar. Considerava que o que estas pessoas faziam era com o intuito de proporcionar puro prazer e não de magoar intencionalmente. Para conseguir as fotografias de uma forma autêntica, ele mesmo teve ir à procura dos seus sujeitos em discotecas gays e até participar em alguns desses actos de forma espontânea.

Para além disso, também fotografava frequentemente mulheres nuas, como a própria Patti Smith e Lisa Lyon, campeã internacional de bodybuilding, por quem se sentiu atraído devido à dualidade de uma mulher com tal constituição física. Novamente, este escolhia fotografar os seus sujeitos dessa maneira com a intenção de quebrar a norma, o tabu, e a ideia estandardizada de estética. Através de composições rigorosamente planeadas, com atenção à luz e à exposição, Mapplethorpe evidenciava a beleza natural do corpo humano. Desde que começou a fotografar, tinha também o gosto em fotografar flores, abraçando a sexualidade e sensualidade da flora. Era com estas que treinava a sua aptidão técnica.

Grande parte do seu trabalho era revelado a preto-e-branco, pois gostava do monocromático, sobretudo quando fotografava sujeitos negros. Acreditava que desta maneira transmitia melhor a riqueza de pele destas pessoas e o contraste com os sujeitos de pele branca, novamente desafiando as ideias de estética e beleza física.

E a sua morte

O fotógrafo foi dado como morto na manhã de 9 de Março de 1989, em Boston. Morreu de SIDA (na América denominada de AIDS), numa altura em que a doença se estava a alastrar pelo país a um ritmo arrebatador. Um filme associado a essa altura, para quem tenha curiosidade é o Rent, um filme de 2005 adaptado de um musical do mesmo nome cujo um dos temas é precisamente a epidemia da SIDA em Nova Iorque.

Antes de falecer, fundou a Robert Mapplethorpe Foundation, uma fundação que visa preservar o seu trabalho, apoiar fotógrafos e museus e contribuir para os avanços médicos e estudo da SIDA.

A nudez e a arte

Apesar de em Portugal a discussão do trabalho de Mapplethorpe ter surgido com o conflito entre a https://staging2.shifter.pt/wp-content/uploads/2021/02/e03c1f45-47ae-3e75-8ad9-75c08c1d37ee.jpgistração de Serralves e o seu ex-director artístico João Ribas, não é a primeira nem a última vez que as obras do artista foram motivos de intervenções relacionadas com o pudismo e a censura da expressão humana por parte da população conservadora. Por exemplo, numa das suas exibições em Cincinnati, nos EUA, após o fracasso de um grupo de pessoas de cancelar a exposição, a polícia acabou por invadir o museu, reclamando acusações de obscenidade e ataque ao pudor.

O debate da nudez como arte tem vindo a ser um tema cada vez mais frequente, por exemplo, em relação ao Instagram, cujas regras não permitem fotografias onde sejam explicitamente representados órgãos genitais, seios femininos, ou actos amorosos de cariz sexual. A este propósito, existe um movimento chamado Free The Nipple, que visa combater a mentalidade da mostra do seio feminino como um ato de qual as mulheres se deviam sentir envergonhadas.

Sem impor opinião absoluta sobre o assunto e para incitar debate, partilhamos uma citação do pintor renascentista Michelangelo:
“Que espírito é tão vazio e cego, que não consegue reconhecer o facto de o pé ser mais nobre que o sapato e a pele mais bonita do que o ornamento com a qual foi coberta?”

Índice

  • Inês Devezas

    Possui formação Técnica de Audiovisuais e tem também um grande interesse por Jornalismo. Dada a sua vocação para o Cinema e Arte, faz questão de escrever sobre tudo o que são eventos culturais e artísticos que invadam a cidade do Porto.

Subscreve a newsletter e acompanha o que publicamos.

Eu concordo com os Termos & Condições *

Apoia o jornalismo e a reflexão a partir de 2€ e ajuda-nos a manter livres de publicidade e paywall.

Bem-vind@ ao novo site do Shifter! Esta é uma versão beta em que ainda estamos a fazer alguns ajustes.Partilha a tua opinião enviando email para comunidade@shifter.pt