Contra “ditadura da presença permanente”, Ada Colau deixa o Twitter

Contra “ditadura da presença permanente”, Ada Colau deixa o Twitter

A Presidente da Câmara de Barcelona diz que a energia e o tempo empregues no Twitter e nas suas políticas acabam por provocar uma deformação da realidade, sobre-representando as polémicas e os discursos de ódio e promovendo uma percepção cada vez mais negativa da humanidade em geral. 

“Se aconteceu está no YouTube, se existe encontra-se no Google e se tem aspirações políticas é provável que esteja no Twitter.”, não é mas bem podia ser uma frase descritiva do panorama dos social media aos dias de hoje. Nos últimos anos, o Twitter tornou-se num dos mais populados espaços de debate político, e a presença na plataforma tornou-se indispensável para quem quisesse estar por dentro dessa discussão. É no Twitter que vemos os partidos e instituições a endereçar mensagens mais curtas que rapidamente são assimiladas pelos jornalistas, que se comentam os grandes casos da política ao segundo, ou que os políticos assumem a escrita na primeira pessoa e sem intermediação para dar a conhecer as suas opiniões, e tudo isto fez com que a rede fosse ganhando preponderância para esta facção em específico – uma preponderância que, contudo, nem sempre foi vista com bons olhos até pelos exemplos que se faziam ver e ouvir acima de qualquer outra coisa.

Donald Trump foi um dos símbolos máximos da fusão entre a política e o Twitter e o final do seu mandato, com todos os fenómenos que o marcaram, um exemplo claro das várias dimensões da plataforma. É que se os argumentos da comunicação instantânea e sem intermediários podem soar benéficos para um político à procura de plataforma, as dinâmicas da rede social são frequentemente apelidadas de tóxicas. A circulação de desinformação, a tendência para a extrema polarização e formação de bolhas ou violência de discurso gratuito, muitas vezes propagado por contas falsas, são algumas das críticas mais comuns sobre a rede social que ainda assim não afastam boa parte dos interessados na discussão, talvez por de alguma forma sentirem a necessidade de lá estar presentes. Necessidade a que se opõe Ada Colau, Presidente da Câmara de Barcelona, que esta semana anunciou a sua saída por tempo indefinido da plataforma.

Num post publicado no seu Twitter, Ada enuncia as coisas boas e más do Twitter e a sua despedida, sublinhando concretamente que a sua partida da rede é como que uma resposta à “ditadura da presença permanente” impsulinada pela rede. Ada descreve esta “ditadura” como a necessidade criada pela plataforma – subjacente a fenómenos como o conhecido Fear Of Missing Out (FOMO) – para que todos opinem sobre tudo o que se passa e, de preferência, que o façam de forma vocal e polémica para que sejam notados. A activista política vai ainda mais longe na reflexão sobre este fenómeno, dizendo que a energia e o tempo empregues no Twitter acabam por provocar uma deformação da realidade, sobre-representando as polémicas e os discursos de ódio e promovendo uma percepção cada vez mais negativa da humanidade em geral. 

Na publicação, que assume um tom pessoal e quase confessional, Colau reitera que não “está louca” por querer fazer política fora do Twitter e que é precisamente por querer fazer política da forma em que acredita que tomou a decisão, dizendo que a política é diálogo e debate e que isso está cada vez mais difícil de fazer no Twitter, onde a proliferação de contas falsas leva muitas vezes à intoxicação das conversas.

“Cheguei à conclusão que na política existe demasiado ruído, testosterona e reclamações de tweets fáceis, e falta empatia, complexidade, escuta, pedagogia e matizes.”, escreve antes de anunciar a sua opção por redes menos “polarizadas e aceleradas”, e de reportar os efeitos da experiência de semanas fora do Twitter. Colau diz mesmo que o tempo distante da plataforma a fez restaurar parte da esperança na humanidade, perceber melhor o que une as diferentes pessoas e ter mais tempo para ler e pensar, pontos positivos num balanço em que a incidência no curto prazo é o principal ponto negativo.

“Quais são os meus objectivos? Fazer boa política, uma política que transforme a realidade e melhor a vida das pessoas, ser cada vez melhor presidente, e dentro do possível, ser cada vez melhor pessoa. Depois de analisá-lo com calma, creio que o Twitter me prejudica nesse objectivos e por isso tomo a decisão serena de o deixar”, diz no término da sua curta mensagem – escrita em castelhano e em catalão, claro está – antes de abandonar o Twitter e deixar os links para outras das suas vias de comunicação, como Instagram ou Telegram.

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